Os computadores resolvem o problema dos cirurgiões-dentistas que nasceram com menos destreza manual? Marco Bianchini aborda o tema.
Destreza é a capacidade e característica que qualifica uma pessoa hábil, que consegue realizar funções com perícia, aptidão, agilidade e rapidez. Normalmente, a destreza está relacionada com a habilidade manual de um indivíduo, ou seja, a facilidade que possui em administrar vários objetos com as mãos ao mesmo tempo. A destreza manual é essencial para a realização de algumas atividades, como tocar alguns instrumentos musicais (violão, guitarra e piano, por exemplo), escrever, costurar, ou mesmo realizar cirurgias médicas e, obviamente, procedimentos odontológicos.
Segundo alguns historiadores, em 1946, o Papa Pio XXII discursou para cirurgiões-dentistas e disse: “A Odontologia é uma profissão que exige, dos que a ela se dedicam, o senso estético de um artista, a destreza manual de um cirurgião, os conhecimentos científicos de um médico e a paciência de um monge”. Desde então, esse pensamento passou a constar em quase todos os convites de formaturas de Odontologia. Essa frase virou um mantra entre os cirurgiões-dentistas e nos remete a extrema necessidade que temos de ter “certa” habilidade ou destreza manual. Desta forma, se um indivíduo não possui essa certa habilidade manual, ele deveria procurar outra profissão que não seja a de cirurgião-dentista.
Se eu tivesse seguido à risca o raciocínio descrito acima, certamente hoje eu não seria um cirurgião-dentista. Nunca fui forte em habilidades manuais e a minha destreza não era das melhores. Eu descobri isso logo nos primeiros anos da graduação. Porém, a descoberta desta deficiência me levou a aumentar a minha carga de treinamento para corrigir esta limitação. Com muito treino e repetição, eu fui conseguindo melhorar as minhas habilidades e a destreza manual e, assim, me tornei um cirurgião-dentista aceitável. O treinamento intenso transforma os “mãos duras” em pessoas com habilidade, mesmo que não tenham nascido com esse dom.
Com o avanço da era digital, todas as áreas do desenvolvimento humano e de serviços se modificaram. E a Odontologia também recebeu este impacto de mudanças. Uma profissão que, no passado, era tida como algo extremamente artesanal, hoje tornou-se uma atividade muito mais precisa. Os computadores e as máquinas foram substituindo o trabalho manual e artesanal. Assim, a solução para o tratamento dos pacientes está ficando mais rápida, fazendo com que o trabalho do cirurgião-dentista tenha mais precisão, evitando erros e eliminando o desconforto dos clientes. O que antes poderia demorar entre três e quatro consultas para ser feito, atualmente é realizado em apenas alguns minutos. Tudo isso graças à Odontologia Digital.
É inquestionável que estamos vivendo na era digital, e nada mais natural do que utilizar essas soluções mais modernas no tratamento odontológico dos nossos pacientes. Os sistemas digitais trazem maior previsibilidade e precisão para o tratamento, além de eliminarem o desconforto dos pacientes com os métodos tradicionais. Porém, algumas perguntas ainda ficam martelando na minha cabeça: a era digital eliminou a necessidade de sermos habilidosos? A destreza manual ficou em segundo plano? As máquinas e computadores resolvem o problema dos cirurgiões-dentistas menos afortunados que não nasceram com o dom da habilidade manual?
Acredito que, como qualquer área em desenvolvimento, a Odontologia Digital também requer habilidades e destrezas específicas. É importante ressaltar que, para lidar com esse tipo de tecnologia, é preciso investir tempo em treinamentos que facilitarão o uso do equipamento escolhido. E, assim, retornamos à necessidade de termos habilidades e destreza manual, para nos adaptarmos ao manuseio dos equipamentos digitais. Desta forma, mesmo que as máquinas façam muito do nosso trabalho, a nossa profissão sempre vai exigir muito das nossas mãos, e estas devem estar sempre muito bem treinadas e preparadas para os novos desafios que o futuro nos reserva.
“E o Espírito de Deus encheu-os de sabedoria do coração, para fazer toda a obra de mestre, até a mais engenhosa, e a do bordador, em azul, e em púrpura, em carmesim, e em linho fino, e do tecelão; fazendo toda a obra, e criando invenções.” (Êxodo 35:35)
Referência
Emanuelle Ferreira. Site Empreendedor Dentista (on-line). Disponível em: <https://empreendedordentista.com.br/odontologia-digital/>. Acesso em 11-12-2019.
Marco Bianchini
Professor associado II do departamento de Odontologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC); autor dos livros “O Passo a Passo Cirúrgico na Implantodontia” e “Diagnóstico e Tratamento das Alterações Peri-Implantares”.
Contato: bian07@yahoo.com.br | Facebook: bianchiniodontologia | Instagram: @bianchini_odontologia