Marco Bianchini analisa a importância da estabilidade primária e cita estudo que pode trazer um novo caminho para os implantodontistas.
Um dos conceitos mais antigos e ainda persistentes na Implantodontia é que a estabilidade inicial do implante é um requisito fundamental para a obtenção da osseointegração. Os principais parâmetros envolvidos são a condição óssea (qualidade e quantidade), a macrogeometria do implante (desenho do corpo e rugosidade da superfície), desenho da osteotomia (brocas) e a adaptação passiva do implante no osso (coeficiente de atrito). Assim, ao longo das últimas décadas, se aceitou a teoria de que para alcançarmos uma osseointegração adequada, seria de fundamental importância que uma boa estabilidade primária do implante fosse alcançada após sua instalação no leito preparado no tecido ósseo. Isso seria crucial para o sucesso em longo prazo do implante.
Todos nós ainda acreditamos que uma baixa estabilidade inicial (primária) pode permitir o micromovimento do implante durante o período de cicatrização, e um tecido fibroso pode se formar na interface entre o osso e o implante, levando à falha da nossa tão esperada osseointegração. Assim, quando os implantes têm bons valores de estabilidade primária, nós sabemos que o tempo de cicatrização pode ser menor ou até mesmo imediato (carga imediata). Entretanto, quando os implantes apresentam baixos valores de estabilidade primária, eles fatalmente exigem tempos de espera mais longos para a obtenção de uma cicatrização óssea adequada (osseointegração).
Essas informações adquiridas sobre a estabilidade dos implantes podem ajudar a determinar o tempo de espera da osseointegração para cada caso e de maneira individualizada. Isso aumenta a segurança dos tratamentos, a eficácia e, em alguns casos, diminui o tempo necessário para se concluir todo o tratamento. Eu mesmo ainda costumo anotar no prontuário com quantos newtons o implante travou e, assim, determino a data da reabertura e da confecção da prótese.
Seguindo essa linha de raciocínio, algumas pesquisas vêm aparecendo na literatura nos últimos anos, tentando minimizar essa necessidade extrema de uma estabilidade primária, sem que isso prejudique o tempo de osseointegração. Dentre esses trabalhos, podemos destacar uma publicação muito interessante, que saiu em dezembro de 2019, do meu colega e amigo Professor Sergio Gehrke, que foi capa de uma revista internacional de alto impacto, que trazemos aqui o link para o acesso a íntegra do artigo: http://www.implacil.com.br/wp-content/uploads/2019/11/jfb-10-00047.pdf.
Esse trabalho desenvolveu uma nova macrogeometria para os nossos implantes, com a ideia de se evitar a compressão óssea, durante a inserção do implante, sem que isso gerasse a perda da estabilidade inicial após a instalação da fixação. Câmaras de cicatrização conhecidas como healing chambers foram criadas no corpo do implante, para descompressão óssea, gerando espaços para depositar o osso durante a inserção do implante. Essas câmaras seriam o espaço livre criado dentro das roscas do implante, resultante da relação diâmetro da broca-implante. A figura 1 ilustra esse conceito.
A conclusão deste trabalho in vitro foi que, em comparação à macrogeometria regular de implantes, a nova macrogeometria, com as câmaras de cicatrização, apresentou baixos valores de torque de inserção sem afetar os valores do quociente de estabilidade primária do implante. Além disso, o torque de inserção e os valores do quociente de estabilidade primária do implante não diferiram em relação ao tratamento de superfície dos implantes testados. Finalmente, não foi encontrada correlação entre o torque de inserção e os valores do quociente de estabilidade primária medidos pelo dispositivo Osstell.
O que mais nos motiva a continuarmos a exercer essa maravilhosa especialidade, chamada Implantodontia, é justamente esta mudança de paradigmas que a ciência nos proporciona. Assim, na medida em que as pesquisas nos mostram um novo caminho a seguir, é muito importante que aceitemos as mudanças e iniciemos um processo de reciclagem, para nos adaptarmos aos novos conceitos. Ver um implante entrar macio no osso, com um torque de inserção leve, muito provavelmente não vai mais tirar o sono de ninguém.
Sugestão de leitura
Gehrke SA, Pérez-Diaz L, De Aza PMPN. Biomechanical effects of a new macrogeometry design of dental implants: an in vitro experimental analysis. Funct. Biomater 2019;10(47). DOI:10.3390/jfb10040047.
“E o enchi do Espírito de Deus, de sabedoria, e de entendimento, e de ciência para qualquer trabalho. Para elaborar projetos, e trabalhar em ouro, em prata, e em cobre, e em lapidar pedras para engastar, e em entalhes de madeira, para executar qualquer tipo de atividade.” (Êxodo 31:3-5).
Marco Bianchini
Professor associado II do departamento de Odontologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC); autor dos livros “O Passo a Passo Cirúrgico na Implantodontia” e “Diagnóstico e Tratamento das Alterações Peri-Implantares”.
Contato: bian07@yahoo.com.br | Facebook: bianchiniodontologia | Instagram: @bianchini_odontologia